sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Um suspiro de vida na Paulista

Era fim de tarde, a noite já caía. São Paulo estava como normalmente está nesse horário: trânsito insuportável, pessoas sempre correndo, transporte público lotado. Um empurra-empurra no ônibus, um sofoco pra se sentar, mas ela conseguiu. Com a cabeça encostada na janela mal via o que passava por seus olhos. Por longos minutos só pensou nas várias coisas que tinha pra fazer na faculdade, nas dificuldades do dia-a-dia, na saudade de casa. Nem percebia o mundo lá fora.
   Quando parou com devaneios percebeu que o ônibus tinha parado no semáforo e que já estava na Paulista. Avenida sufocante, cheia e iluminada. Assustou-se com o tanto de gente que passava pelas largas calçadas, parecia um formigueiro. Ninguém se olhava, sorria ou pedia licença. As pessoas pareciam robôs. Será que ela era assim?
   Não teve tempo de refletir, quando olhou para a calçada de novo viu que um senhor de cabelos compridos e brancos tocava violino. Estava sentado num banquinho baixo e conduzia seu instrumento de olhos fechados. Ele usava um colete colorido por cima da camiseta e uma boina cinza. Parecia tocar o violino com uma facilidade imensa enquanto esperava por alguns trocados que poderiam ser deixados na caixa do instrumento à sua frente. A multidão passava apressada, ninguém parava para apreciar aquela melodia. Enquanto a garota pensava o quanto isso era triste, um casal parou, trocou olhares e se abraçou. Os dois começaram a dançar de olhos fechados, unidos pela música que ecoava naquela avenida fervorosa no horário de pico. Era uma mulher magra, esbelta e de aparência serena. Usava um vestido longo e um casaco por cima. Seu par era um homem alto e barbudo, que usava roupa social. Os dois rodopiavam conforme a música sem se preocuparem com a multidão que desviava deles. Aos poucos as pessoas foram parando para olhar e sorrisos afloravam de bocas antes cheias de preocupações. O senhor que tocava abriu os olhos e sorria. Moedas e notas caíam sobre a caixa de seu violino. E o casal continuava embalado pela melodia sem abrir os olhos.
   O semáforo abriu e o ônibus se moveu. A garota não pôde mais ver o casal ou o músico. Por alguns instantes ficou pensando na cena que a deixara tão emocionada e esqueceu suas preocupações. Sentiu um solavanco, então olhou para o lado e se lembrou que estava num ônibus lotado. Não pôde deixar de escutar a conversa de duas mulheres que estavam sentadas à sua frente:
Essa Paulista enche o saco, hein?
Pois é! Odeio perder meu tempo aqui, ainda tenho que passar no mercado.
E a garota pensou: ‘’Será que tem leite lá em casa?’’

OBS: Eis mais uma atividade de faculdade que é muito Infinito Particular

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

                                                             Leminski 

''Daqui desse momento
Do meu olhar pra fora
O mundo é só miragem
A sombra do futuro
A sobra do passado
Assombram a paisagem.
Quem vai virar o jogo
E transformar a perda
Em nossa recompensa
Quando eu olhar pro lado
Eu quero estar cercado
Só de quem me interessa.
Às vezes é um instante
A tarde faz silêncio
O vento sopra a meu favor
Às vezes eu pressinto e é como uma saudade
De um tempo que ainda não passou
Me traz o seu sossego
Atrasa o meu relógio
Acalma a minha pressa
Me dá sua palavra
Sussurra em meu ouvido
Só o que me interessa.
A lógica do vento
O caos do pensamento
A paz na solidão
A órbita do tempo
A pausa do retrato
A voz da intuição
A curva do universo
A fórmula do acaso
O alcance da promessa
O salto do desejo
O agora e o infinito
Só o que me interessa.''
                                  ''Fica um pouco mais, que tal mais um café?''


A súplica dos remediados

Esse cotidiano sufoca, amedronta.
E de que adianta?
Estuda, trabalha, cultiva o valor
das coisas pequenas,
até demais.
As grandes estão lá fora no frio
sem esperança, cuidado, casaco.
E a vida aqui dentro reclama, suplica.
Mas afinal, suplica pelo quê?

Ele

 Uma atividade da faculdade que se transformou em algo tão particular que agora tá aqui:

   Há histórias que não começam e não terminam bem. Porque são cheias de egoísmo, irresponsabilidade e abandono. Características muito presentes nele. Não foi preciso conhecê-lo muito para afirmar categoricamente que tinha atitudes de um adolescente mimado que foge dos problemas. Muitos contaram sua história e sempre com ódio ao dizê-la, porque magoou todos, principalmente a garota. É difícil colocar em palavras quando a proximidade da garota com ele é tanta e a mágoa parece mais um mar de ressaca. O coração quase explode como as ondas estouram na costa.
    Se você errou, arque com as consequências, sejam elas boas ou ruins. Enfrente como pode, ninguém espera que você seja perfeito, apenas que seja o melhor que pode. Mas ele não tentou, não fez nada, não esteve ali. Ele optou pelo mais fácil, que foi o mais difícil para todos os outros.
    O ressentimento não era fruto apenas da autopiedade da garota, mas da raiva por ele ter feito aquela mãe sofrer também. Abandonar da forma como abandonou alguém que você jurou amar é covardia, é fraqueza, é detestável. Deixou a mulher com um grande problema (e um grande presente?) no colo. Voltou com a outra mulher, com quem já tinha um dia começado uma família. É assim que a história começa.
    Algum tempo depois a mãe morre. De angústia, sofrimento, escolha própria. E a consciência dele talvez tenha pesado, ninguém saberá. Mas ele escolhe voltar, resolve tentar consertar o que fez. Procura o fruto de seu romance antigo, mas a garota o odeia, não suporta vê-lo invadindo sua vida como se sempre tivesse estado ali. Depois de algumas tentativas bastante evasivas e sem sucesso ele desiste. A história se desenrola com novas construções familiares e muita dor da garota ao tentar lidar com as perdas e com a culpa que sentia em relação a elas. Por anos ela sofreu por detestar o homem mais do que poderia suportar. Mas com o tempo tanto sentimento impuro foi diminuindo, ela talvez um dia conseguisse não sentir mais nada. Poderia até quem sabe reencontrá-lo. Mas o fim da história não se sabe, na verdade nem se sabe se ela terá um fim.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Aquele abraço!

Do contra

  


  Por que resolveu um dia escolher jornalismo? Tinha que desejar justo essa profissão? Pra brigar a vida inteira com o pai, ganhar pouco, trabalhar demais, abrir mão de tempo com os amigos e família, viver mais a vida dos outros que a sua. Foi porque quis mudar o mundo, se irritou com tanta merda que acontece, queria remar contra a maré. 
  Tem dias que fico em crise, confesso. Muitos dias. Nesses quero largar a faculdade e correr pra qualquer cidadezinha esquecida pelos olhares dos grandes. Ou quero simplesmente ir fazer administração, seria menos tortuoso. Ou quero fazer um mochilão, entrar pra uma tribo e nunca mais voltar. Mas são histórias como a de Amarildo, relatos como os de Arbex e um coração um tanto quanto sonhador que me fazem ter a certeza que eu escolhi certo. 
  Ninguém vai ver meu nome brilhando na Globo ou nos grandes jornais. Só quero alguns cantinhos de páginas que poucos dão atenção. Mas estes exclamarão ''que bom que ainda existem jornalistas de verdade''. E não estou me gabando, mas se eu não for jornalista de verdade não sei o que serei. Porque jornalista é aquele que vai contra o sistema, se é pra ir atrás dos grandes por que foi escolher essa profissão? Pra mim a melhor definição do que comecei a ser é do contra. E os do contra são aqueles a favor dos pequenos.